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terça-feira, 16 de novembro de 2010

A CHAPA 6 – TRANSFORMANDO O TÉDIO EM MELODIA – PENSA EM CULTURA

Em 1938, no contexto entre-guerras, o poeta, escritor e teórico do surrealismo André Breton e o artista plástico Diego Riveras, um dos maiores pintores mexicanos, se encontraram com o revolucionário russo Leon Trotsky na cidade do México, na ocasião de seu exilo político, e juntos escreveram um documento chamado “Por Uma Arte Revolucionária Independente”. Este documento faz uma análise da situação da produção artística e das políticas públicas para a cultura no mundo daquela época. Criticaram as restrições de liberdade, as formas de financiamento de projetos artísticos e atividades culturais, criticaram os mecanismos de controle e os mecanismos de incentivo.
O convite aqui, caro leitor é a uma reflexão comparativa desse mundo de 1938, descrito nesse documento, e do mundo atual em que vivemos, com o objetivo de nos ajudar a compreender as demandas de políticas para a cultura e como a UFMG e o DCE se inserem nesse debate. É preciso portanto considerar que a UFMG e o DCE não são instituições ou instrumentos isolados de um contexto, mas fruto de um passado e se articula no presente com toda a sociedade em todos os ramos do fazer social.
Em 1938, quando esses intelectuais, artistas e revolucionários socialistas se encontraram no México, a segunda guerra estava prestes a eclodir, sendo uma dedução lógica apresentada por eles no próprio texto. O cenário mundial que eles apresentam no texto é o da grande depressão econômica e de avanço de regimes totalitários de Hitler, Mussolini e Stálin. Após reconhecerem que a produção artística e cultural possui suas próprias leis naturais, dentre elas a liberdade de pensamento, expressão e criação, e observando o papel do estado de interferir nessas leis naturais necessárias à produção intelectual, artística e cultural, eles afirmam que:

“o mundo atual nos obriga a constatar a violação cada vez mais
geral dessas leis, violação à qual corresponde necessariamente um
aviltamento cada vez mais patente, não somente da obra de arte, mas
também da personalidade “artística””.

Eles ainda ilustram como atuavam o nazismo e fascismo, para além do aviltamento, ditando o conteúdo de cada obra de arte a ser concebida:

“O fascismo hitlerista, depois de ter eliminado da
Alemanha todos os artistas que expressaram em alguma
medida o amor pela liberdade, fosse ela apenas formal,
obrigou aqueles que ainda podiam consentir em
manejar uma pena ou um pincel a se tornarem os lacaios do regime
e a celebrá-lo de encomenda, nos limites exteriores
do pior convencionalismo.”

Sobre A URSS e os PCs espalhados pelo mundo, o texto ainda afirma que:

“Sob a influência do regime totalitário da URSS e por intermédio dos
organismos ditos “culturais” que ela controla nos outros países, baixou
no mundo todo um profundo crepúsculo hostil à emergência de qualquer
espécie de valor espiritual. Crepúsculo de abjeção e de sangue no qual,
disfarçados de intelectuais e de artistas, chafurdam homens que fizeram
do servilismo um trampolim, da apostasia um jogo perverso, do falso
testemunho venal um hábito e da apologia do crime um prazer. A arte
oficial da época estalinista reflete com uma crueldade sem exemplo na
história os esforços irrisórios desses homens para enganar e mascarar
seu verdadeiro papel mercenário.”


Pensando nos dias de hoje, em especial no Brasil onde parece estarmos vivendo o maior nível de democracia que nossa história política já alcançou, a sensação imediata que temos é que vivemos uma realidade distante da que Breton, Riveras e Trotsky descrevem. Entretanto, o que pretendo demonstrar aqui é que, por mecanismos diferentes e em diferentes graus e níveis de violência, as leis naturais que deveriam reger a produção artística no mundo e no Brasil continuam sendo violadas, e o respeito a essas leis ainda é uma conquista a ser feita por parte dos artistas, intelectuais, pensadores, estudantes e trabalhadores. É aí, caro leitor, que se insere o DCE da UFMG e a própria UFMG.
Esses mecanismos se materializam nas precariedades em que os organismos públicos de fomento e incentivo à cultura, nas formas de políticas públicas estabelecidas. A liberdade é cerceada em cada edital público de incentivo à cultura, que submete o conteúdo dos projetos culturais aos interesses do estado e da iniciativa privada. Todo artista precisa ser remunerado para disponibilizar seu tempo de trabalho à pesquisa de criação e à própria criação artística, como também precisa de recursos financeiros e estrutura de espaço físico e equipamentos. Na nossa sociedade democrática, ou o artista é rico e garante sua liberdade de produção, ou o artista precisa se sujeitar aos mecanismos de incentivo do estado e da iniciativa privada, disputando com seus pares para ver quam vai agradar mais aos projetos políticos em vigor pelo Estado e empresas, para então ter acesso aos recursos financeiros.
Tal situação nos permite uma comparação direta com o que se cita acima sobre as políticas culturais dos regimes autoritários, com a diferença que no lugar de armas, se tem coação político-financeira e de estrutura material física, sem a qual nenhum artista consegue desenvolver sua produção e é obrigado a tornar-se um trabalhador do mundo do subemprego. Segue agora alguns exemplos dessa realidade atual. Esses exemplos serão dados num contexto nacional, estadula, municipal e por último dentro da nossa universidade. A esses exemplos completo com os posicionamentos da nossa Chapa sobre como a UFMG e o DCE se portam ou deveriam se portar em cada um dos casos.

Por Um Real Fundo Nacional de Cultura:

A criação de um Fundo Público para financiamento de projetos culturais, sempre foi uma reinvindicação do setor produtivo em arte e cultura no Brasil. Recentemente, após a realização de alguns seminários “democráticos” o MinC lançou o “Pro-Cultura”. O Pró-Cultura compõe-se de um fundo que utiliza parte dos recursos do MinC para financiamento público de projetos culturais sem reembolso. Entretanto, esses recursos são muito limitados comparados aos recursos ainda destinados para o incentivo fiscal (Lei Rouanet) que continua beneficiando a iniciativa privada e aos agenciadores. O Pró-cultura se divide em vários e pequenos editais muito específicos destinados a públicos muito específicos, excluindo boa parte do setor que produz arte e cultura, estes editais estão sendo abertos por curto período de tempo.
A situação não muda muito da administração petista ou tucana, no Estado de Minas, os artistas, produtores e detentores de saberes tradicionais também sofrem com a distribuição de recursos públicos que financiem as suas atividades. São dois principais mecanismos de financiamento público: O Fundo Estadual de Cultura, caracterizado por ser recurso público direto e a Lei do ICMS, ou Incentivo Fiscal. O Fundo é aberto apenas para pessoas jurídicas, excluindo grande parte dos artistas e detentores de saberes tradicionais de acessar os recursos, enquanto o Incentivo Fiscal (Lei do ICMS) – que beneficia mais as empresas patrocinadoras do que o artista – é aberto a todos mas têm demonstrado ser ineficiente quando a maior parte dos projetos aprovados em 2008 não foram desenvolvidos em 2009 por falta de captação (patrocínio). Devido a crise financeira, as empresas preferem sonegar os impostos ao Estado a pagar esses impostos de forma mais barata e ganhando publicidade em cima dos artistas.
Os estudantes de música e músicos em geral foram pegos de surpresa com a criação da orquestra filarmônica de MG. Segundo a wikipédia, A orquestra filarmônica é sustentada por uma instituição privada, ficando assim a sinfônica mantida por uma instituição pública. Em 2006, os músicos da orquestra sinfônica de Minas Gerais, sediada na Fundação Clóvis Salgado, fizeram uma paralisação contra a criação do ICOS - Instituto Cultural Orquestra Sinfônica - uma OSCIP, Organização da Sociedade Civil de interesse Público. Os músicos rechaçaram essa proposta por que mudariam de regime de trabalho, a qual passaria de Estatutário para CLT – uma forma de privatização. Eles também reivindicavam aumento salarial uma vez que possuíam o menor salário dos músicos de orquestras estaduais do Brasil. Não tendo pleno sucesso no projeto de privatização da sinfônica, em 2008 o Estado e a FCS incentivou a criação da Orquestra Filarmônica que, qualidade musical a parte, é uma orquestra privada que tem ocupado os espaços antes destinados à orquestra sinfônica.
Fora esse caso, temos o coral lírico do estado que há muitos anos não vemos concurso público e tende a acabar com a aposentadoria dos atuais cantores. É preciso ainda pensar no papel que a Fundação Clóvis Salgado cumpre. Sendo uma instituição pública que oferece cursos profissionalizantes em arte, todos com uma cobrança de mensalidade abusiva, limitando o acesso a esses cursos apenas para quem pode pagar.
Achamos que o DCE deve se posicionar pelo financiamneto público da orquestra sinfônica, sua reestruturação, pelos direitos trabalhistas dos seus músicos, como ampliação das vagas com concurso público. Achamos que o DCE deve se posicionar contra toda iniciativa de privatização e sucateamento dos instrumentos culturais da sociedade mantidos pelo estado e das instituições de capacitação e formação em arte e outros ramos da cultura.
Não podemos deixar de falar dos mesmos mecanismos no município que, após anunciar um aumento de recursos para a Lei Municipal de Incentivo à Cultura, o prefeito de Belo Horizonte manteve o orçamento do edital de 2009 igual ao de 2008, não cumprindo com a sua palavra. A Fundação Municipal de Cultura (antiga Secretaria Municipal de Cultura que foi privatizada tornando-se Fundação na administração petista), atrasou na liberação do resultado da seleção, anunciando quase no mesmo dia que liberou a lista de selecionados, o cancelamento do FIT-2010 – Festival Internacional de Teatro. Graças à mobilização dos artistas da cidade, que promoveram inúmeros protestos, a Fundação foi obrigada a voltar atrás e realizar o FIT-2010, entretanto nem se tocou no assunto do corte de recursos do Fundo de Projetos Culturais da PBH. Outras pérolas da administração municipal são a proibição de eventos culturais na Praça da Estação, o que levou muitos ativistas do movimento estudantil e dos diversos setores produtivos em arte e cultura a se manifestarem, através da "Praia da Estação".
Achamos que o DCE junto com os DAs da música, belas artes e letras devem se somar à luta do setor artístico para a real criação do Fundo Nacional de Projetos Culturais em detrimento à lei Rouanet e ao Pró-Cultura, com edital amplo, de forma que abarque qualquer área do setor produtivo em arte e cultura e, aberto durante todo a ano com aprovações mensais de projetos e sem juízo de valor sobre os conteúdos dos projetos. Achamos que o DCE e esses mesmos DAs devem se somar na luta dos setores de produção artística e cultural pela transformação das leis de incentivo fiscal e leis de fundos públicos, extinguindo-se o mecanismo de incentivo fiscal, transformando todos os recursos do incentivo para fundo, com ampliação das verbas e desburocratização do acesso.
Criticamos à atual gestão do DCE por que em nenhum momento se posicionou, nem sequer soltou uma nota de repúdio à Fundação Municipal de Cultura ou de apóio aos artistas da cidade, na ocasião da tentativa de cancelamento do FIT-2010 e não apareceu para dar apóio aos banhistas-manifestantes da 'Praia da Estação"..

Na UFMG

Assistimos por dois anos consecutivos uma diminuição da qualidade e do número de espetáculos, shows e oficinas desenvolvidas nas duas últimas edições do FESTIVAL DE INVERNO da UFMG. A edição de 2010, a mais reduzida, nem edital de seleção de espetáculos, oficinas e shows foi aberto. A reitoria argumenta que o Festival foi reelaborado para mudar de caráter, tendo menos apresentações artísticas e mais debates e aulões em Praças Públicas. Observando porém os orçamentos do festival nos últimos anos, podemos ver que, o que a reitoria fez, na verdade, foi sufocar o orçamento do Festival impedindo as contratações artísticas, seu processo de seleção, comprometendo a qualidade e forçando os seus elaboradores a repensarem o festival e buscarem apoio na iniciativa privada. Infelizmente a Gestão do DCE Outras Palavras nem se pronunciou.
Achamos que o DCE deve ser um parceiro da DAC - Diretoria de Ação Cultural - na elaboração do Festival de Inverno e que essa parceria seja presente durante todo o ano nas atividades de lazer e cultura promovidas pela DAC - uma tarde no Campus, Quarta Doze e Trinta - e pelo DCE - Calouradas e Festival de Cultura Universitário. Defendemos que o DCE deve ser um instrumento de luta em defesa da manutenção e ampliação da qualidade do FESTIVAL DE INVERNO DA UFMG.

Escola de Música:

A Escola de Música tem sofrido com falta de salas para estudo e de professores. Antes da ampliação das vagas e criação dos novos cursos (musicoterapia e música popular) esses já eram um problema conhecido pelos estudantes. Hoje, como o REUNE não prevê verbas e contratação suficiente para a demanda real dos novos cursos, esses problemas se agravaram de forma que os professores do Departamento de Teoria Geral da Música encontram-se cumprindo carga-horária acima do que deveriam para dar conta de ofertar as disciplinas e das atividades de pesquisa e extensão. Os alunos são quem mais sofrem com aulas pouco preparadas, professores sobrecarregados, e disputa por salas para o estudo de instrumento.
Apesar disso, a escola de música possui um prédio anexo, o CMI - Centro de Musicalização Infantil – que é utilizado para aulas de música para crianças cujos pais pagam mensalidades abusivas à FUNDEP. Achamos que o prédio do CMI deve ser usado para as aulas da graduação e espaço de estudo de instrumento dos alunos da graduação prioritariamente. Achamos que as atividades desenvolvidas no CMI com crianças devem visar à pesquisa na área de educação musical e à extensão através da criação de convênios com escolas públicas localizadas em torno do Campus, sem cobrança de mensalidade dos alunos.
Achamos também que é necessária a realização de concurso público para efetivação de instrumentistas e coristas a compor a orquestra sinfônica, os grupos instrumentais e o coro de câmara, abrindo oportunidade de trabalho para quem se forma e estruturando esses importantes grupos institucionais da universidade que possuem caráter pedagógico, profissional e institucional, mas que hoje sobrevivem com a mão de obra dos estudantes que são obrigados a compor esses grupos instrumentais com alguns bolsistas recebendo uma bolsa de valor irrisório pelo trabalho.

Artes Cênicas:

O prédio da Escola de Artes Cênicas é comumente chamado pelos próprios estudantes como um "puxadinho" da Belas Artes. As promessas de construção de um prédio de verdade nunca saíram do papel. Recentemente o TU - Teatro Universitário - foi retirado do Bairro Santo Antônio (antiga FAFICH) e transferido para o "puxadinho das cênicas". Além de piorar a questão do espaço, inviabilizou o uso da biblioteca do TU que não encontrou lugar para seu acervo no prédio novo. E nem precisamos dizer que, por mais que as linguagens contemporâneas de teatro dispensem o espaço do palco italiano, é um absurdo o curso de artes cênicas e TU não possuírem um prédio-teatro de verdade com todos os recursos da caixa preta.
Achamos que o DCE deve lutar pela construção de um prédio de verdade para o curso de artes cênicas e teatro universitário, com toda a infra-estrutura necessária para o pleno desenvolvimento das atividades de ensino, pesquisa e extensão em teatro, como também deve lutar para a construção de Grupos de Pesquisa de Linguagem Teatral com abertura de concurso público para atores, dramaturgos, diretores, figurinistas e equipe técnica em geral. Da mesma maneira deve se dar estrutura ao curso de dança oferecido agora pelo REUNE para que o curso de dança não signifique mais gente sofrendo com a falta de estrutura.


Belas Artes:

Sobre os cursos de Belas artes e suas várias habilitações, desde cinema de animação até design de moda, pode-se observar que todos sofrem com a falta de salas e professores. A idéia de se fechar a biblioteca e a galeria de exposição para usar seus espaços como sala de aula, não só é absurda como demonstra a necessidade urgente de ampliação do prédio.
E para não nos esquecermos, é preciso relembrar o tempo que os estudantes do curso de design ficaram sem aulas por falta de professores e de sala de aulas.



Conclusão:

Nos finalmente do texto de Riveras, Trotsky e Breton, para definir o posicionamento crítico dos autores, o texto cita uma passagem de Karl Marx que, embora se refira ao “Escritor”, afirma servir a todo trabalhador do setor produtivo em cultura. Vamos terminar nossa reflexão para a cultura nessas eleições de DCE com a mesma passagem. Vote chapa 6 para que a política cultural do DCE não se resuma apenas à calourada, mas sim chegue a ações de verdade.

"O escritor, diz ele, deve naturalmente
ganhar dinheiro para poder viver e escrever, mas não deve em nenhum
caso viver e escrever para ganhar dinheiro... O escritor não considera de
forma alguma seus trabalhos como um meio. Eles são objetivos em si,
são tão pouco um meio para si mesmo e para os outros que sacrifica, se
necessário, sua própria existência à existência de seus trabalhos... A
primeira condição da liberdade de imprensa consiste em não ser um
ofício. Mais que nunca é oportuno agora brandir essa declaração contra
aqueles que pretendem sujeitar a atividade intelectual a fins exteriores a
si mesma e, desprezando todas as determinações históricas que lhe são
próprias, dirigir, em função de pretensas razões de Estado, os temas da
arte. A livre escolha desses temas e a não-restrição absoluta no que se
refere ao campo de sua exploração constituem para o artista um bem
que ele tem o direito de reivindicar como inalienável. Em matéria de
criação artística, importa essencialmente que a imaginação escape a
qualquer coação, não se deixe sob nenhum pretexto impor qualquer
figurino.”

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